Denúncia Pública

Excelentíssima Senhora Procuradora-Geral da República, M.I. Doutora – Lucília Maria das Neves Franco Morgadinho Gago

João Paulo Saraiva Amaral da Encarnação, vem pelo presente esta representação desta Associação, dirigir-se mui respeitosamente a V. Exa para denunciar nos termos e pelos factos seguintes:

  1. O sucedido no concelho de Manteigas no dia 13 de Setembro, não pode ser encarado como simples culpa dos incêndios de Agosto, ou da Natureza, deve ser visto também pelo ponto de vista das responsabilidades daqueles que estando mandatados, optam por posturas populistas e eleitoralistas em detrimento do cumprimento das suas competências e atribuições no que à proteção civil é atinente.
  2. A Lei 65/2007, alterada pelo Decreto-Lei 44/2019, consideram a existência de Unidades Locais de Proteção Civil, podendo estas ser constituídas por cidadãos integrados como voluntários de proteção civil, para atuar nas fases de prevenção e mitigação; emergência; recuperação, devendo para isso ser preparados de modo que passem de parte do problema a parte da solução.
  3. Estão preceituados na Lei, um conjunto de instrumentos de proteção civil que se revelam não implementados na prática, daí resultando falhas transversais às situações de acidente grave ou catástrofe, por demais evidenciados nos incêndios de Junho e Outubro de 2017, mas patentes, ano após ano, aos olhos mais atentos no âmbito da proteção civil, sendo por demais evidentes os incumprimentos autárquicos que contribuem para o avultar do prejuízos de qualquer ocorrência, sem que os seus responsáveis sejam responsabilizados cível e criminalmente, facto que onera recorrentemente os contribuintes com o resultado da inércia e inépcia do poder político autárquico, nomeadamente resultantes do incumprimentos das seguintes competências a atribuições legais:

“1 – Compete ao SMPC executar as atividades de proteção civil de âmbito municipal, bem como centralizar, tratar e divulgar toda a informação recebida nesta matéria.

2 – Nos domínios da prevenção e avaliação de riscos e vulnerabilidades, compete ao SMPC:

  1. a)Realizar estudos técnicos com vista à identificação e avaliação dos riscos que possam afetar o município, em função da magnitude estimada e do local previsível da sua ocorrência, promovendo a sua cartografia, de modo a prevenir, a avaliar e minimizar os efeitos das suas consequências previsíveis;
  2. b)Propor medidas de segurança face aos riscos inventariados;
  3. c)Operacionalizar e acionar sistemas de alerta e aviso de âmbito municipal;
  4. d)Assegurar a pesquisa, análise, seleção e difusão da documentação com importância para a proteção civil.
  5. e)[Revogada.]
  6. f)[Revogada.]
  7. g)[Revogada.]
  8. h)[Revogada.]
  9. i)[Revogada.]

3 – Nos domínios do planeamento e apoio às operações, compete ao SMPC:

  1. j)Elaborar planos prévios de intervenção de âmbito municipal;
  2. k)Preparar e executar exercícios e simulacros que contribuam para uma atuação eficaz de todas as entidades intervenientes nas ações de proteção civil;
  3. l)Manter informação atualizada sobre acidentes graves e catástrofes ocorridas no município, bem como sobre elementos relativos às condições de ocorrência e à respetiva resposta;
  4. m)Realizar ações de sensibilização para questões de segurança, preparando e organizando as populações face aos riscos e cenários previsíveis;
  5. n)[Revogada.]
  6. o)Fomentar o voluntariado em proteção civil;
  7. p)[Revogada.]

4 – Nos domínios da logística e comunicações, compete ao SMPC:

  1. q)Inventariar e atualizar permanentemente os registos dos meios e dos recursos existentes no concelho, com interesse para as operações de proteção e socorro;
  2. r)Planear o apoio logístico a prestar às vítimas e às forças de socorro e apoiar logisticamente a sustentação das operações de proteção e socorro;
  3. s)Levantar, organizar e gerir os centros de alojamento a acionar em caso de acidente grave ou catástrofe;
  4. t)Planear e gerir os equipamentos de telecomunicações e outros recursos tecnológicos do SMPC;
  5. u)Manter operativa, em permanência, a ligação rádio à rede estratégica de proteção civil (REPC);
  6. v)Assegurar o funcionamento da sala municipal de operações e gestão de emergências nos termos do artigo 16.º-A.

5 – Nos domínios da sensibilização e informação pública, compete ao SMPC:

  1. w)Realizar ações de sensibilização e divulgação sobre a atividade de proteção civil;
  2. x)Promover campanhas de informação junto dos munícipes sobre medidas preventivas e condutas de autoproteção face aos riscos existentes e cenários previsíveis;
  3. y)Difundir, na iminência ou ocorrência de acidentes graves ou catástrofes, as orientações e procedimentos a ter pela população para fazer face à situação.”
  4. Ontem mesmo, com a conclusão do processo “de Pedrogão Grande”, em nossa convicção três autarcas com responsabilidade criminal no desfecho da catástrofe de 17 e 18 de Junho de 2017 ficaram impunes. Enquanto a impunidade autárquica durar, a inércia e inépcia no que concerne à proteção civil continuará a compensar, e os prejuízos e vidas perdidas ou para sempre irremediavelmente alteradas continuarão a acumular-se. A justiça pode não ter condenado, mas, a APROSOC – Associação de Proteção Civil, condena moralmente os autarcas dos concelhos e suas freguesias de Pedrógão Grande, Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pera, pela inércia e inépcia em proteção civil e defesa da floresta contra incêndios que, em nossa absoluta convicção, contribuíram inequivocamente para as mortes ocorridas naqueles incêndios, o mesmo se aplicando a todos os demais concelhos do país onde ocorreram mortes em incêndios rurais em 2017 e não só. Nenhum autarca onde em Outubro de 2017 morreram cidadãos nos incêndios foi constituído arguido, algo inaceitável para esta Associação face aos por demais evidentes indícios de inércia e inépcia no âmbito das suas competências e atribuições em Proteção Civil.
  5. Por tudo isto, não pode a APROSOC – Associação de Proteção Civil, enquanto parte da sociedade civil organizada para a defesa dos interesses e direitos dos cidadãos no acesso a serviços de emergência e proteção civil, adequados, atempados e de qualidade, deixar de denunciar estes casos, ou compactuar com inações conducentes a mais mortes, supressão da dignidade de vida, ou elevados prejuízos materiais para alimentar a subsidiodependência do Estado Português junto de Bruxelas, ou que o “coitadismo” possibilite no cumprimento das metas do défice.  Assumimo-nos estatutariamente como uma Associação de Defesa do Consumidor de Serviços de Emergência e Proteção civil.
  6. Alterar este paradigma errático patente em praticamente todas as autarquias, depende em nossa convicção da ação do Sistema Judicial, tendo ao longo dos anos todos os demais esforços diplomáticos, falhado.
  7. Independentemente da ação soberana da Procuradoria Geral da República, a APROSOC – Associação de Proteção Civil, condena os autarcas de todos os concelhos em incumprimento das suas competências e atribuições em Proteção Civil, destacando-se nos casos mais recentes, o de Manteigas, Covilhã, Ourém, Seia, Mafra, Ferreira do Zêzere, Tomar e demais na mesma situação, não pela perda de vidas, mas porque essa inércia e inépcia é inevitavelmente conducente a que mais cedo ou mais tarde elas ocorram e, cremos que tudo devamos fazer para evitar termos de o lamentar.

A proteção civil começa em cada um de nós.

Com os melhores cumprimentos,

João Paulo Saraiva
Presidente da Direção
Coordenador Operacional do Agrupamento de Proteção e Socorro