Antes de mais leia-se “bombeiros” como todos os que no sistema integrado de operações de proteção e socorro respondem a pedidos de socorro, sejam Bombeiros, INEM, Cruz Vermelha ou similares.
Falar de quem socorre é como falar de “pedras preciosas”, todos sabem que têm muito valor, mas também todos sabem que não há pedras preciosas acessíveis a todos. No quotidiano o sistema já tem dificuldade de responder atempadamente a todas as emergências e, quase todos os dias morre gente, alguma de tenra idade por escassez de recursos humanos para operacionalizar meios que já de si são escassos pelo facto de estarem monopolizados por alguns lóbis e não abertos a mais entidades.
Mas quantos são esses operacionais, 30.000? 50.000?, os dados são do gabinete estatístico comunitário, o Eurostat, e revelam que, em 2021, Portugal tinha 14.037 bombeiros profissionais empregados, vamos imaginar que são 500.000, e que em pleno verão no combate aos incêndios 50.000 estão empenhados nas operações de vigilância, combate, socorro e administração relacionada com os incêndios e que, ocorre em Lisboa um sismo semelhante ao de 1755, precisamente quando ocorrem grandes eventos culturais na cidade e que, cerca de 2Milhões de pessoas, incluindo “bombeiros” são vítimas ou têm familiares feridos, mortos, ou que perderam as suas casas, muito provavelmente a capacidade de resposta do sistema de socorro desce para os típicos menos de 10% num país onde a capacidade de resposta quotidiana já é insuficiente. Acresce que também os hospitais sofrem danos e baixas e, ainda que as vítimas sejam transportadas em muitos casos não serão tratadas, acabando por morrer.
O cidadão crê que num cenário desses liga 112 e vai ter socorro, mas num cenário desses nem o 112 funciona, pelo simples facto de que ocorrerão avarias nas redes de telecomunicações, o número de chamadas será superior ao número de operadores telefónicos nas centrais 112 e outras centrais de emergência e, também esses operadores serão ou terão familiares que foram vítimas e por isso colocaram os seus em primeiro lugar.
A solução é simples, formar toda a população para a resposta às emergências, fazendo aumentar o número de socorristas e reduzir assim o número de dependentes dos serviços de emergência para as situações mais simples de socorrer, deixando assim os escassos recursos humanos que restarem para socorrer e tratar os casos mais críticos.
Na atualidade por exemplo a ordem dos enfermeiros não quer comuns cidadãos a praticar atos de enfermagem para não retirar empregabilidade aquela classe profissional, mas num cenário de catástrofe onde estarão os enfermeiros disponíveis para dar uma injeção a um doente crónico que antes ia ao centro de saúde? Onde estarão os enfermeiros para fazer um penso pós-operatório a alguém que está a convalescer em casa? Onde estarão os enfermeiros para fazer um penso a alguém com uma hemorragia ou queimadura?
O mesmo sucede com a ordem dos médicos, mas num cenário de catástrofe haverá médicos suficientes para prescrever medicamentos e assim evitar infeções e mortes por ela causadas? Ou mesmo para suturar uma ferida aberta ou reduzir uma luxação?
Como vão as pessoas sobreviver ou retomar a normalidade se acesso a esses serviços dos quais se tornaram dependentes e, como vão retornar à normalidade por exemplo sem acesso a água potável e doenças resultantes do consumo de água imprópria para consumo?
Como vão as pessoas ter acesso a medicamentos se não se prepararam e não mantém reservas em casa, será que com tanta pilhagem que ocorrerá às farmácias creem na sorte de conseguir “aviar a sua receita”.
No sobrevivencialismo há vários tipos de pessoas, os negacionistas que rejeitam a possibilidade de tal ocorrer, os otimistas que creem que tudo correrá bem, os pessimistas que acham que tudo correrá irremediavelmente mal e, os preparacionistas que creem que tudo pode correr mal, desejando que tudo corra bem e que, com a sua preparação são capazes de eliminar alguns constrangimentos e resolver alguns problemas ou, até mesmo “passar pelos pingos da chuva” se tiverem a sorte de não terem sofrido ferimentos e tiverem reservas adequadas às suas necessidades e autonomia por exemplo alimentar, capacidade de produzir soluções para tratamentos ainda que não tão eficazes quanto os medicamentos comerciais, bem como uma habitação resistente inclusive a tentativas de assaltos, o que implica meios de defesa da família e da habitação.
Quando pensamos nestes cenários cremos sempre que aconteceram quando estamos em casa e que sairemos com a nossa mochila de sobrevivência, mas e se acontecer quando estamos na rua e não conseguirmos regressar a casa para ir buscar a mochila, ou se a casa desapareceu e se transformou num monte de escombros?
Quando pensamos nestes cenários imaginamo-nos vestidos a rigor para lidar com a situação, mas se estávamos a tomar banho na casa de banho e sobrevivemos ou na piscina quando a casa ruiu?
Se no quotidiano não há “bombeiros” suficientes para responder atempadamente a todas as ocorrências, como pode alguém ter a convicção de que em caso de catástrofe tudo vai correr bem?
Bem sabemos que muitos creem na ajuda divina, mas, sejamos honestos, quantos santos, deuses ou anjos já vimos a controlar hemorragias, a combater incêndios, a reanimar vítimas, a desencarcerar vítimas, que não aqueles de carne e osso que dão diariamente o seu melhor no limite das suas forças? Quando precisamos desse tal socorro divino que enche os cemitérios que evidências científicas existem da sua proficuidade?
Que raio vai uma mãe sem leite dar ao seu recém-nascido quando todas as farmácias e os supermercados forem pilhados? Como vai sobreviver o hipertenso ou o hipotenso nesse cenário? Como sobreviverá o insulinodependente nesse cenário?
Como vai comprar ou trocar algo para sobreviver se todo o dinheiro que tinha estava depositado e tudo o que tinha para troca estava na casa que ruiu ou foi consumida pelas chamas?
Como vai comunicar com o seu filho que suspeita estar vivo nas ruínas de um edifício se não houver rede de telemóvel e não tiverem ambos sempre consigo walkie-talkies?
Temos no quotidiano crianças e jovens que morrem por caírem de janelas em que os crentes na proteção divina não colocaram redes ou grades. Temos quotidianamente gente que morre à espera da cura divina porque os crentes não procuraram a ajuda médica. Temos quotidianamente gente que fica de braços cruzados perante uma hemorragia ou uma paragem cardiorrespiratória à espera de que cheguem os “bombeiros” ainda que não cheguem a tempo de salvar. Temos até gente que perante um ferimento de tiro de caçadeira que atinge uma artéria ao invés de um garrote, compressas ou uma peça de roupa a estancar a hemorragia, aplicam reiki. Temos até a hipocrisia e egoísmo de achar que tem de haver alguém que nos saiba socorrer, mas não sentimos o dever de aprender a socorrer o nosso semelhante. Que raio de sociedade somos nós, fundamentalistas?
Uns creem na Branca de Neve e nos sete anões, outros creem no Pai Natal, outros creem em anjos da guarda, outros em santos deuses e salvações divinas, outros creem em governantes que têm a desfaçatez de afirmar que o socorro é garantido e que em caso de catástrofe todos serão socorridos sem contudo garantirem que o serão atempadamente, cada um crê no que bem entender e ninguém tem nada a ver com isso, o que não podem é os crentes em ilusões perante as aflições vir tirar proveito da ajuda daqueles que se prepararam, porque ou se preparam todos para socorrer o seu semelhante ou não têm moral para exigir ser socorridos e, os nossos governantes apregoem a sete ventos que tudo vai bem e que os serviços estão preparados para responder a qualquer situação.
Nunca teremos “bombeiros” em número suficiente para responder atempadamente a todas as situações e morre todos dias gente por isso, se cada um de nós não estiver preparado com conhecimentos e bens essenciais para sobreviver provavelmente terá uma morte precoce face a um desastre. Na saúde e na proteção civil a sua proteção é você, o resto só por sorte ou cunha.
Imagem meramente ilustrativa de autor desconhecido.