Artigo de opinião: sobre o “radioamadorismo” contemporêneo

Há dias um colega falou-me de uns QSOs pela manhã no repetidor de VHF da Arrábida e, como raramente frequento repetidores, mas fiquei curioso, lá fui eu no dia seguinte ver se me identificava com os QSOs para eventualmente participar. Infelizmente desiludi-me, pois, para ter QSOs daquela natureza não preciso ter Certificado de Amador Nacional, basta ter um CB ou um PMR446. É triste que alguém use frequências de radioamador como quem usa o CB ou o PMR446, com a agravante de que através do repetidor a mensagem chega mais longe e a mais pessoas.

Saudosos tempos em que só se podia falar de técnica nas frequências de radioamador, talvez por isso eu seja um radioamador que raramente usa as frequências de radioamador, porque de facto a cordialidade e o nível nos QSOs tem sofrido uma degradação com a qual não me identifico.

Certamente muitos ao ler isto estarão a pensar que bom, menos um esquisito com o palavreado verborreico que a malta usa, contudo, consciente disso, prefiro deixá-los vencer pela minha inação do que ser conivente com eles na sua ação.

Saudosos tempos da Direção dos Serviços Radioelétricos dos CTT, tinham mais poder, pedagogia e autoridade, do que aquilo a que hoje chamam de “AUTORIDADE NACIONAL DE COMUNICAÇÕES”!

O radioamadorismo não está a morrer, está bem vivo, foi invadido pela boçalidade sob o argumento dos direitos de igualdade. Um dia destes ainda exigem em noma da igualdade que todos sejam boçais porque a maioria o é e não o ser dá muito trabalho. Sorte a minha que não me restam muitos anos de vida para o constatar.

Os macanudos invadiram as frequências de radioamador e, no meu caso prefiro mesmo o CB e o PMR446 em grupos de comunicação com objetivos de interesse público e grupos de pessoas que embora reduzidos pautam pelo respeito, cordialidade, temas interessantes e úteis e, acima de tudo boas práticas nos procedimentos radiotelefónicos.

Não entendo bem por que raio se faz um exame para obtenção de um Certificado de Amador Nacional, quando na prática nem procedimentos radiotelefónicos cumprem, limitam-se a usar eletrodomésticos que nem sequer são capazes de programar ou ajustar adequadamente em função das guide lines internacionais e, ao invés de propagarem pelo mundo a língua de Camões, propagam uma espécie de parolice cebeistica a que certos dirigentes de Associações e grupos de radioamadores aderem com muita naturalidade.

De facto, a Constituição da República Portuguesa, consagra no seu artigo 37.º a Liberdade de Expressão e Pensamento, mas, será que isso significa que em breve qualquer cidadão em nome da igualdade possa usar as frequências de radioamador sem sequer ter de fazer exame que na realidade em nada valida conhecimentos adquiridos e proficuidade instalada na operação?

Que o criador me leve antes que tal aconteça, porque os novos valores não podem significar a perda de valores.

Continuo a apoiar amigos a entrar no radioamadorismo, mas sempre pautarei por lhes transmitir os valores que distinguem as pessoas de bem dos grunhos, sem prejuízo de desenvolver continuamente ações conducentes a dar a oportunidade aos cidadãos mais desfavorecidos no acesso ao conhecimento e aos nobres valores na génese do radioamadorismo, mas, repudiando por completo que quem não aceite essa doutrina alimente o crescimento do vandalismo do radioamadorismo. Sei que aminha ação é praticamente inócua, mas, enquanto viver, quero fazê-lo de acordo com a minha consciência e com os valores que me foram transmitidos nomeadamente pela instituição militar.

João Paulo Saraiva
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